Sempre que compro uma bike, o caminho até lá chegar é sempre
o mesmo: um longo namoro com meia dúzia de bikes, uma longa sucessão de avarias
e de idas ao mecânico, uma série de dias em que as voltas não são satisfatórias
por o equipamento estar nas últimas, uma série de voltas em que me corto a
fazer isto ou aquilo para poupar o equipamento, até que chega o dia, em que já
de cabeça um bocado perdida, decido que preciso realmente de uma bike nova. A
Pitch portou-se heroicamente durante 7 anos, mas estava na hora de gozar uma
reforma tranquila e ficar de reservada para dias com menos porrada.
good old mate
Quando finalmente decidi começar a ver a sério, fui ver as
marcas habituais e o que havia agora no mercado, mas havia três coisas que
tinha bem definidas: quadro em alumínio, 160mm de curso traseiro e 65º de
angulo de direcção. Acabei com algumas “finalistas”, a inevitável YT Capra, a
Canyon Torque, a Nukeproof 275, a Commencal Meta AM 4.2, a Radon Swoop 170 e a
Vitus Sommet. No final, a coisa já estava reduzida à Commencal e à Vitus, e uma
promoção na CRC acabou por ditar a escolha final, que foi a Vitus Sommet.
Nestes 8 anos, grandes evoluções tecnológicas ocorreram no mundo das bikes,
pelo que já sabia de antemão, que qualquer que fosse a escolha, ia ser uma bike
desta nova geração de enduristas bem diferente das que tinha tido até agora, e
a Sommet está carregada de novidades:
Direct 2 Consumer
Antes da bike em si, já o processo de compra foi uma
novidade. Uma marca que só vende directamente ao consumidor. Esta foi a
primeira bike que comprei para mim, online, de uma marca que só vende online. Aliás,
todas as finalistas da “consulta de mercado” eram de marcas D2C. Ainda dei uma
volta por algumas lojas, mas tudo o que fosse de 2017 ou 2018, tinha preços de
2020. A CRC é a minha loja de confiança, já sou cliente há mais de
10 anos, e estava certo de que a compra ia correr bem. O envio foi super
rápido, demorou uma semana. A bike chegou “quase” impecável. Deve ter levado
uma porrada algures e trazia uma pequena marca na tinta, que não tem mais de
2mm de diâmetro. E como já sabemos que os negócios online vivem da reputação,
foi só mandar para lá uma foto, dizer que estava insatisfeito, e mais um
desconto se pôs a caminho. Se algum de vocês tem dúvidas sobre comprar uma bike
online... esqueçam-nas! Conseguem uma bike por 50% daquilo que vos ia custar na
loja!
i want my money back!
Slack Geometry
Quando se fala de angulo de direcção de 65º e de distancia
entre eixos de 1170mm estamos a falar das medidas do DH Racing por volta de
2010. Isto era a geometria das Santa Cruz V10 que viamos a passar em Sintra. E
portanto, sabemos que estas medidas são bastante agressivas. Havia um pequeno
receio de que a direcção fosse molengona ( 65 de angulo + rodas 650B + guiador
wide) mas com os avanços curtos actuais, já calculava que uma coisa compensasse
a outra. Outra coisa que me preocupava era a altura do eixo ao solo, que tem
vindo a ser reduzida, mas o que verifiquei nos trilhos, foi que em algumas zonas
em que a Pitch raspava a pedaleira, com a Sommet passo sem espinhas. Ainda
falta levar a bicha para os trilhos da Malveira, e aí é que eu acho que esta
geometria vai-se fazer notar ainda mais positivamente.
V-Link
Quando penso em sistemas de suspensão avançados, os
primeiros que me vêm à cabeça são o DWLink e o VPP. Assim que apareceram os
primeiros pivots virtuais, achei-os uma solução magnifica: o eixo de rotação do
sistema não existe propriamente, muda de sitio conforme o curso activado, e
pode ser colocado onde for mais conveniente. O sistema da Sommet é um “4 bar vlink”, ou seja, mistura o
nosso conhecido “4 bar linkage” com um pivot virtual. É uma espécie de DWLink
mas com o triangulo traseiro sem estar unificado. E estou completamente
rendido. A bicicleta não bombeia a subir – baixa os 25% de SAG e
dali já não mexe, e a descer, existe uma sensação de progressividade que nunca
tinha sentido. Ainda não a esgotei, e estou convencido que isso só vai
acontecer no primeiro dia de capacete integral e de protecções...
V-Link
650B
Fique já bem claro: houvessem ainda bikes decentes com rodas
26, e este parágrafo não estava aqui. Nem é por desconfiar de algum modo das
rodas 650B mas as 26 polegadas eram o último standard do MTB, e basta ver a
quantidade de sites de bikes e de equipas amadoras que têm no seu nome
“qualquer_coisa_26” para se perceber como esta medida era diferenciadora e
importante no mundo do MTB. E o que me faz ser reticente em relação às 650B nem
é resistência à mudança, é saber que a indústria anda desejosa de nos levar
para as rodas 29. E em relação a essas, sim, tenho muitas dúvidas que sejam
indicadas para o MTB. Mas como 650B é o novo standard e como não o consegui
evitar, lá vieram duas rodas grandalhonas a equipar a Sommet. E tudo aquilo que
eu pensava que sabia confirmou-se: de facto, de um modo geral, são melhores que
as 26. São mais confortáveis em velocidade e têm mais grip nas curvas mais
rápidas e sem apoio. No entanto, e um bocado de propósito, levei a bike a um
trilho ali na Carregueira que é o “snake trail”, que tal como o nome sugere, é
uma sucessão interminável de curvas contra curvas extremamente apertadas. E foi
aí, e apenas aí, que senti que estava com rodas grandes e que havia uma certa
necessidade de manobrar a bike com mais agressividade. Há muitos kms por fazer
até ter uma opinião definitiva, mas até agora, estou a gostar.
fuckin' Millenials...
Wide Bars
Assim que o pessoal da Santa Cruz Syndicate apareceu há uns
anos atrás com guiadores de 800mm (810 para o Minaar) muitos perguntavam se não
se estaria a levar a moda das wide bars um bocado longe demais. Mas pelos vistos
não, porque uns anos depois, vemos que o standard das bikes de enduro está nos
780mm (800 para as bikes L e XL). Isto era completamente impensável nos tempos
em que os guiadores elevados eram tão frágeis, que traziam uma peça de ligação,
entre os dois lados do guiador, à semelhança dos de BMX.Mas o alumínio evoluiu e já no ano passado tinha equipado a
Pitch com um guiador de 785, pelo que a transição já tinha ocorrido. E de
facto, um guiador largo faz toda a diferença: antigamente, nos “fundamentals”
de quem gostava de descer, uma das regras era “cotovelos levantados”. Agora,
com guiadores da largura dos nossos ombros, ja não é preciso pensar nisso,
porque os cotovelos ficam precisamente como devem estar.
1X10
Com a primeira bike de montanha que tive, veio o primeiro
desviador. E veio também uma certa sensação de que me tinham enganado. Aquilo
dizia que tinha 18 velocidades, mas rapidamente percebi que dessas 18, haviam
talvez umas 9 que eram únicas. Na verdade, todas as relações que se obtinham
com o prato do meio, eram repetíveis no prato mais pequeno ou no maior. Para
além disso, ao operar simultanemante com um prato de 22 e de 44 dentes e com
cassetes de 12-50, há determinadas relações em que se fizermos as contas,
estamos com 30 elos de corrente a mais (ou a menos). Claro que parte da missão
do desviador é absorver este excesso e manter a corrente esticada, mas não há
mola que consiga absorver isto tudo e com frequência, a primeira meia pedalada
é para meter tensão na corrente. Quando os engenheiros conseguiram espremer 10
velocidades na mesma cassete, alguns riders meteram-lhe uma mega range de 50+
dentes, e abdicaram dos 3 pratos e desviador frontal, e muito rapidamente isto
passou a ser a regra no enduro. Um prato é perfeito. A corrente está
sempre em tensão com a ajuda da guia, e as mudanças entram como se tivessem
embraiagem. No caso da Sommet, já tinha lido em algumas reviews que o
prato de 32T era demasiado ambicioso. Não é que não se
façam as subidas na mesma, mas o esforço envolvido é desnecessário.
Manitou
À medida que se acumulam anos a ridar, acumulam-se um
infindável número de marcas fetiche. Umas porque são de facto as que têm os
melhores produtos em determinada categoria, outras porque se associaram a este
ou aquele rider, outras porque têm produtos inovadores e com abordagens
diferentes das habituais, e algumas que nem sabemos bem porquê. As bikes da
Intense, os travões da Magura, os amortecedores da Öhlins, os desviadores da
Sachs, as pedaleiras da Race Face, os ténis da 5-10, os pneus da Maxxis, as rodas
da Tioga, ou as suspensões da Fox, são exemplos de algumas marcas marcantes por
uma razão ou outra.
A Intense M1 do Palmer com travões Magura (1995)
Já tinha tido suspensões de todas as marcas decentes que
conheço. Geralmente a escolha acabava em Marzocchi ou Rock Shox, que são marcas
mais em conta, mas também já tinha tido Fox. No entanto havia uma marca que
habitava aqui o subconsciente desde os anos 90. A Manitou era conhecida pelas
suspensões high-end, mas ficou ainda mais conhecida quando lançou no mercado
uma coroa dupla de baínhas invertidas – a Manitou Dorado. Gostava tanto desta
suspensão, que a Hot Chili de DH que tive, esteve quase quase a ser equipada
com uma. E o facto de a Sommet trazer uma Manitou Mattoc, acabou por também ser
um factor a seu favor. E posso ir já dizendo que é a melhor suspensão que já
tive, apenas comparável à Fox40, que tem mais 40mm de curso.
Ride It
Quando comprei a Pitch em 2011, queria uma bike que desse
para pedalar. Tinha um canhão de DH para os dias de maluqueira, com a carrinha
de alguém ou com o teleférico de um bike park. Mas a verdade, é que esses dias
foram sendo cada vez menos, até que decidi vendê-la. E a pitch, apesar de muito
competente a descer, tinha as suas limitações, pelo que já há uns anos que não
tinha um verdadeiro “shred sled”.
No dia em que recebi e montei a Sommet, fui logo dar uma
voltinha só para ver como é que aquilo era e fui imediatamente descer umas
escadas aqui ao pé. E voltei a ter aquela sensação de “magic carpet” tipica das
bikes de DH, de que não interessa ou quão irregular é o terreno, que de alguma
forma a bike vai absorver aquilo tudo. Nos dias seguintes, levei-a para os cada vez mais degradados
trilhos de Belas. A descer, a bike gosta de velocidade e é nos trilhos mais
irregulares que brilha mais. É dificil explicar o quão entusiasmante esta bike é a descer, mas
talvez isto vos ajude a compreender: já ando a ver se compro um colete de DH
novo, porque o bichinho das descidas, que andava adormecido há uns tempos,
voltou a despertar com esta máquina!
Falta o derradeiro teste: a Malveira! Não tardará muito em
levar até lá a bike para fazer umas descidas em autonomia...