segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

"Afinal que dia é hoje?"

Pois é pessoal, durante tantos anos de rides no meio do mato já vi e ouvi falar de muita coisa... braços partidos, bikes partidas, costelas partidas, clavículas partidas, capacetes partidos, queimaduras abrasivas graves, uns que ficam sem baço, outros sem um rim, e até já vi umas mamas esfoladas. Tudo coisas, que apesar de dolorosas, um gajo chega e sabe dizer o que é. Mas o nosso Covas gosta de coisas esquisitas, e a descrição do neurocirurgião para o sucedido com o nosso rapaz foi "é tipo um arranhão no cérebro". Eu diria que arranhões foi noutros tempos, isto foi mesmo "encostar o pistão"...



O dia prometia. A GAS está cada vez mais internacional, e para além do Rogério e Cristiano a representarem a canarinha, tínhamos o Sir Alistair a raidar connosco, a representar o azul e branco da Escócia. Para albergar tanto ciclista, tínhamos arranjado a carrinha do nosso patrocínio, a sempre grande Associação Académica da Amadora. Depois das recolhas dos riders e respectivas máquinas, chegámos a Sintra, e enquanto uns se equipavam, eu e o Tó montávamos uns travões novos na Chili, o que me valeu ser logo o primeiro a conduzir.

GAS International



As primeiras descidas do dia foram nos agora "ilegais" trilhos da Malveira. Estava tudo a correr bem a toda a gente e o saldo do dia estava muito positivo, e a única baixa eram as calças do Cristiano que tinham ficado agarradas a uma árvore. Entretanto, e para ajudar à festa, chegou o Jay, que já cheio de saudades das manhãs com adrenalina foi ali ter connosco para nos ver andar. Sem quedas e com tanta confiança, decidimos ir a um trilho na barragem da Mula que o Alistair conhecia, mas nós ainda não. Depois da parte inicial do trilho, que era completamente abusada - uma trialeira brutal, em que o caminho a seguir é tão duvidoso que as pedras estão marcadas com spray laranja de modo a que se saiba qual a trajectória ideal - o trilho fica muito fluido e rápido, super suave e divertido. Talvez tenha sido esse mesmo o problema. A meio do trilho o Alistair avisou-nos acerca de um salto que era necessário pedalar pra chegar ao outro lado, mas a informação não terá chegado a todos. Nesse salto o Covas apenas o "desceu", bateu com a roda da frente e foi catapultado para o chão. A primeira coisa que bateu foi a cabeça e pescoço e quando cheguei ao local estava o homem estendido e muito queixoso.






Nem valia a pena fazer a pergunta da praxe porque era óbvio que ele não estava bem. Mas perante o desorientanço do Covas, cujo primeiro comentário depois de tirar o capacete foi "como é que eu vim aqui parar" outras perguntas se impunham. Ao "como é que te chamas?" ainda respondeu, mas ao "que dia é hoje?", já só obtivemos silêncio. Preocupante, sem dúvida. Comecei por explicar o inicio do dia ao Covas: "foste-me buscar a mim e ao Tó na carrinha da Académica, até deixaste lá o Smart". E a resposta foi uma pergunta "Mas eu tenho um Smart???". E à medida que falávamos a preocupação aumentava, e nem o açúcar do Isostar que andava no camel do Tó estava a compor a situação. Pelo contrário, o Covas, para além de não se lembrar das coisas, não estava a reter absolutamente nada do que lhe diziamos. Perante isto, e com o Covas já mais estabilizado (sim, porque teve à beira do desmaio por um par de vezes), começámos a descer o resto do trilho que faltava, enquanto o Alistair e Roger iam buscar a carrinha. Posso-vos dizer que estes minutos de espera foram talvez dos mais surreais que passei com o Covas, e olhem que depois daquelas noites na Kadoc pensava que já tinha visto tudo. Vou tentar resumir as conversas que se seguiram:

Covas: "Afinal que dia é hoje??"
Sub: "12 de Dezembro"
Covas: "opah vai gozar com o carail, achas que tamos a 15 dias do Natal?? Com este calor??"

Covas: "como é que vim aqui parar?"
Sub: "viemos na carrinha da AAA"
Covas: "mas eu também? Não me lembro de nada"

Covas: "E estamos aqui parados à espera do que?"

Sub: "foram buscar a carrinha, tá o JP lá em baixo"
Covas: "mas o JP tá cá? Ainda não tive com ele pois não?
Sub: "Já Covas, já. Ele não está a andar porque foi operado no Verão."
Covas: "O JP foi operado? Ihh coitado."


Cada uma destas conversas foi repetida umas 20 vezes enquanto esperávamos pela carrinha e a preocupação aumentava sempre que o Covas abria a boca. Já na carrinha, não posso deixar de referir o ar de desapontado do Covas quando perguntou pela 45º vez que dia era. Já fartos do "vão todos gozar com o carail" que nos era devolvido depois de lhe respondermos que dia era, resolvemos passar-lhe para a mão a edição do dia da Bola, que indicava a data no canto superior direito. A tristeza que se abateu sobre o Covas quando verificou que estava mesmo a 15 dias do Natal, foi imensa. Mas mesmo assim, desconfiava que tudo isto era uma grande orquestração nossa para o confundir ainda mais. De caminho chamámos a ambulância e o Covas só se queixava de que ia ter usar uma coleira cervical...


"que dia é hoje?"



Seguiu-se uma longa espera no fim dos trilhos da Malveira pela ambulancia, com o Covas sempre muito comunicativo, mas com o disco um bocado riscado, e depois de duas voltas redondas ali ao pé da fonte, não se lembrava dos minutos anteriores e repetiam-se as mesmas perguntas e os pedidos para fumar um cigarro, pois "já não fumava há horas". Apesar de preocupados, o surreal daquela situação, mantinha-nos com algum sentido de humor. Pior foi mesmo quando tivemos de ligar à Tatiana para explicar o sucedido. Na realidade nem sabíamos bem o que dizer, pois o Covas é um gajo com sintomas "exóticos", e tivemos de tentar explicar que "O Covas tá bem, mas tá assim um bocadinho baralhado, não se lembra bem de algumas coisas. Mas lembrou-se logo do teu numero de telefone por isso podes ficar descansada". Claro que esta conversa não descansa ninguém. É como dizia ao inicio deste post... um braço partido um gajo chega e sabe dizer o que é, mas o Covas népia, é esquisito. Chegado o INEM, fizeram meia duzia de testes de sensibilidade, e começaram a fazer perguntas do "como é que te chamas, onde é que moras, que dia é hoje". Tínhamos esperança que o Covas nos enchesse de orgulho e se lembrasse das 70 vezes que lhe tínhamos dito a data na ultima hora, mas nada. Lá o levaram para o hospital de cascais, e reza a lenda que o nosso Jay accionou a "marcha de urgência" em 4 piscas atrás da ambulância e seguiu sempre atrás deles. Não há bikes, mas ao menos ripa-se no 306. Eu e o Tó seguimos na carrinha. Chegados ao hospital seguiu-se mais uma espera, e entretanto chegaram os pais e irmã do acidentado que apos um RX inconclusivo o acompanharam ao S. Francisco Xavier onde lhe foi diagnosticado o "arranhão no cérebro". Boa, se me tivesse lembrado dessa quando falámos com a Tatiana, tinha ficado muito mais descansada...



não haja dúvidas: era açúcar em pó da arrufadinha!!


Agora tudo está bem, o nosso miudo sabe que faltam 2 semanas para o Natal, e não digo que esteja na posse de todas as suas faculdades mentais, pois na verdade, este não foi o primeiro arranhão naquela zona, mas diria que está na posse das que lhe restam, eheheh.


abraços a todos e as melhoras do nosso rapaz!

1 comentário:

jay disse...

inda dizem q o humor negro é dos ingleses...
enquanto os que lhe sao mais distantes tavam bue preocupados (e com razao) os mais chegados so se riam e gozavam com a situaçao, e aproveitavam cada deixa do "arranhado" para largarem mais uma ou outra laraxa!